PEC 215 Mais um golpe contra os povos indígenas

18/02/2014 12:51

*Por Wilson Matos da Siva

            Foi aprovada na Comissão de Constituição Justiça e Cidadania (CCJ) por Trinta e oito (38) votos a dois (2) pela bancada ruralista e “evangélica” da Câmara Federal, a Proposta de Emenda à Constituição (PEC) 215/2000. A proposta segue agora para Comissão Especial. O ODIN junta-se ao movimento indígena para mobilizar resistência por mais esse golpe aos direitos indígenas.

A PEC sugere a inserção do de inciso XVIII ao art. 49; propõe a modificação do § 4º e acrescenta o § 8º ambos no art. 231, da Constituição Federal, estabelecendo como competência exclusiva do Congresso Nacional a aprovação da demarcação das terras tradicionalmente ocupadas pelos índios e a ratificação das demarcações já homologadas. Absurdo pois constitui um (aberratio iuris) há um ERRO de propósito, a bancada do agro negócio ou ruralista, querendo barrar as demarcações das terras indígenas. Essa PEC atenta contra clausula pétrea da Constituição Federal, que prescreve a independência e harmonia entre os poderes da República.

É um duro golpe aos direitos dos povos indígenas. A União ficará impedida de atuar imediatamente através do Executivo na solução dos graves problemas relacionados à questão dos territórios indígena. É um imenso retrocesso na luta dos nossos povos, pelo reconhecimento aos direitos mais elementares, que é o direito à vida, já que para nós povos indígenas, não há possibilidade de vida sem Terras. Espaço este, garantido e prescrito na Constituição Federal como sendo: “as utilizadas para suas atividades produtivas, as imprescindíveis à preservação dos recursos ambientais necessários a seu bem-estar e as necessárias a sua reprodução física e cultural, segundo seus usos, costumes e tradições.”

A PEC 215/2000, ao conferir competência exclusiva do Congresso Nacional à aprovação das demarcações das terras tradicionalmente ocupadas pelos índios e ratificar as demarcações já homologadas, extrapolará a competência legislativa, subjugando o Executivo de forma que a ação administrativa de demarcação das Terras indígenas, atividade exclusiva do Poder Executivo, ficaria condicionada à validação de outro Poder da República, o Poder Legislativo. A demarcação das terras tradicionalmente ocupadas pelos índios decorre de imperativo constitucional, consignado no caput do Art. 231 da CF, ao estabelecer “competir à União demarcá-las, proteger e fazer respeitar todos os seus bens”.

Nas palavras professor Doutor Paulo Machado Guimarães, a demarcação consiste em ato administrativo, por intermédio do qual a administração pública federal explicita os limites das terras tradicionalmente ocupadas pelos índios, baseado em elementos de prova documental, testemunhal e pericial, fixando marcos oficial, sinalizadores do limite da terra demarcada. Esse ato administrativo tem natureza declaratória dos limites da terra tradicionalmente ocupada pelos povos indígenas, que consiste em um bem da União, por força do que estabelece o inciso XI do art.20 da CF e sobre a qual os índios exercem a posse permanente e o usufruto exclusivo das riquezas naturais existentes no solo, nos rios e nos lagos.

            É evidente que o Congresso Nacional pode propor reforma da Constituição Federal, o que não significa que este, possa suprimir ou substituir decisões políticas fundamentais que constituem a própria essência do ordenamento constitucional, especialmente as vedações expressas no do §4o. do art. 60. O Congresso Nacional no exercício da função reformadora (Poder Constituinte derivado), pode alterar o texto constitucional, através de emendas supressivas, aditivas ou modificativas, desde que respeite as vedações (cláusulas pétreas), porque estas constituem manifestações da vontade soberana do povo, expressa nas decisões adotadas pelo Constituinte.

O confronto entre o Legislativo e Executivo, não contribui em nada se o Brasil pretende vencer o preconceito e se firmar como um país pluriétnico, saldando a dívida histórica com nossos povos indígenas. Avançar nos objetivos constitucional prescrito no art. 3º, I, Construir uma sociedade livre, justa e solidaria, e ainda, III, “Erradicar a pobreza e a marginalização e reduzir as desigualdades sociais e regionais”. Para tanto, é necessário respeito à Constituição Federal, com Poderes independentes, quer dizer, poderes que deliberam e agem, em esferas determinadas, por autoridade própria, não reconhecendo um superior entre si, porém ao mesmo tempo harmônicos, que se entendem, que se auxiliam e colaboram para um mesmo fim, identificado com os objetivos fundamentais da República Federativa do Brasil. 

* É Índio, Advogado, pós-graduado em direito constitucional, 

OAB/MS 10.689 e Jornalista SRTE 773MS

nosliwsotam@gmail.com

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